A moda na história do corpo… Corpo, gêneros e afins… Cada macaco no seu galho.

Tenho por hábito na maioria do tempo que passo sentado no meu carro no trânsito de São Paulo escutar rádio. Sempre de rádio ligado aproveito o trânsito e me entrego, ao invés das músicas as notícias, as mais variadas possíveis, das violentas as curiosas, das esportivas as políticas.

Numa dessas oportunidades, numa noite em que voltava para casa, ouvi pela radio CBN uma entrevista com Ricardo Oliveros, que não conhecia, e que logo em casa, numa pesquisa rápida pela internet descobri ser um jornalista de moda, blogueiro e dono de uma pousada em Ubatuba, para onde foi em busca de maior qualidade de vida. Interessante… Pois, quem vai a Ubatuba num feriado qualquer, talvez duvide que qualidade de vida exista lá, mas enfim…

A entrevista seguia o rumo da moda contemporânea, e uma possível questão de sustentabilidade na mesma. Moda sustentável??? Aquilo me interessou. Ouvindo mais atentamente, aumentando o volume até, Ricardo apresentava algumas opiniões sobre o presente e o futuro da moda, dentre elas, informava sobre pesquisas que já são feitas em torno da possibilidade das roupas serem produzidas em forma de “spray”, “como uma segunda pele”, dizia que este produto já existe e que os estudos atuais estavam acontecendo no sentido de torná-lo mais confortável. O repórter salientava sobre a questão física daqueles que a vestiriam, quais necessidades, pois uma roupa desta exigiria um bom corpo daquele que a usa, aquele que passaria o tal “spray” em si. Sim, é de se pensar, que uma roupa como essa poderia necessitar de corpos mais enxutos, sarados, esbeltos… Apolíneos, porque não? Imediatamente imaginei o que seria de nós, “gordinhos”, andando por ai ostentando nossos pneus, alegres da vida, em roupas sprays coladas ao corpo.  Nesse caso teríamos de ser muito mais fortes do que hoje, no intuito de segurar a barra do olhar do outro, ou o nosso próprio, a nos ferir o ego, a alma e autoestima… Para Ricardo, uma roupa desta de cara, pediria que nós reelaborássemos nossa alimentação, assim estaríamos obrigatoriamente nos alimentando de forma mais saudável… Olha a sustentabilidade! A qualidade de vida! Quem vai querer???

O que mais me intrigou foi o fato que descrevo a seguir. Ricardo foi taxativo em afirmar, que na tendência da moda se observa que os homens tendem a comprar de acordo com a sua necessidade, usando como critério a durabilidade das roupas, sendo assim, um homem que necessita de uma calça, quando a sua já se desgastou, vai a uma loja e diante de várias sugestões do vendedor para jaquetas, blusas etc., se foca principalmente na tal calça que ele realmente precisa, buscando algo que dure em primeiro lugar. Já nas mulheres, foi ressaltado o incrível interesse das mesmas por liquidações, por roupas que busquem combinar o cinto, a blusa o conjunto como um todo, e nesse sentido buscando atender mais a aparência do que a necessidade em si. Assim diz Ricardo, “a  roupa masculina é feita com critérios de durabilidade e a feminina já nem tanto.”

O repórter, não aguentando sugeriu que os homossexuais masculinos, talvez tendessem a buscar uma roupa com critérios mais parecidos com o das mulheres… Em resposta foi dito que no atual momento a tendência era que, uma vez já constituído o público gay, já que este não necessita mais tanto aparecer, se diferenciar, quando do começo do seu movimento, ele hoje já busca uma naturalidade no vestir. E que essa se dá a semelhança dos heterossexuais.

Pois bem, tudo isso abordado o que pensei foi… Temos as nossas diferenças, especificidades e a teremos sempre. Tanto o gênero masculino, como o feminino irão guardar ao avanço dos tempos suas características primordiais. Somos geneticamente iguais e distintos, homens no geral tem mais pelos que mulheres, não menstruam, não engravidam, sua andropausa difere muito da menopausa feminina. Essas características e diferenças, dentre tantas outras, mesmo podendo ser revertidas através de hormônios, operações, maquiagem, roupas e tals, não mudam o gênero, mudam o cidadão político. E é a lei que legitima as transformações, e ela sim podem regular as transformações da sociedade, e com isso o avanço das relações humanas no sentido de atender os desejos mais íntimos do ser.

Operações de trocas de sexo por exemplo permitem que um homem se transforme numa “mulher”, hormônios permitem que homens sejam eleitos em concursos de beleza feminina. Mas somente pela lei, que essa situação é referendada, e assim a sociedade ou entende ou entende é o fato, a lei legitima e pronto. E isso é um avanço, já que a própria lei sentenciou centenas de anos a mulher sem direito ao voto, ao trabalho, sentenciou mulheres a fogueira, as prisões, a assassinatos e execração publica, mas é com a lei que essas mesmas situações são reconhecidas, fruto de um processo histórico-cultural, que vem desde os primeiros humanos na terra. Processo esse forjado na diferença dos gêneros, do masculino e feminino. Claro que numa ótica patriarcalista… Mas o que aconteceria no caso de um matriarcado? Hipóteses diante do real. No conceito de originalidade da obra de arte. Veja o que diz Walter Benjamim em “A Obra de Arte na Era de sua Reprodutibilidade Técnica” (1936) :

                                              “O que caracteriza a autenticidade de uma coisa é tudo aquilo que ela contém e é originalmente transmissível, desde a sua duração material até o seu poder de testemunho histórico.”

Ou seja, estaríamos criando originalmente o gênero biológico travesti? Ou o gênero cidadão-político?… Dizendo; “Este é o travesti original desde os primórdios tempos!”

Benjamin falava da arte, mas se promovermos o humano a categoria de obra arte, pela complexidade de sua existência, e diante de seu alto grau de reprodutibilidade e sua fonte inesgotável de interpretações, este ainda se manteria único. Creio que podemos aproveitar o exemplo e dizer que tanto o homem como a mulher se mantêm originais, que as transformações que seus corpos passaram, passam e passarão ao longo dos tempos, não transformarão o original, salvo mutações inesperadas. E que esse original tem o direito a diversidade, a alteridade… Novos papéis, novas escolhas.

A sociedade, bem mais moderna que outrora, regula as transformações no âmbito da lei, no âmbito da criação de papéis e suas correspondências com os anseios de cada ser. Ser gay, lésbico, transexual, travesti, qualquer coisa não muda a gênese da questão, o gênero humano e suas características próprias, mas diz respeito a situação sobre o aspecto legalista, de cada povo e ou sociedade.

No frigir dos ovos tanto para o homem como para a mulher em sociedade, a busca deve dar-se na melhor acomodação dos seus papéis sociais, independente do sexo, mas este em si terá sempre o original irradiando sua “aura” como ressaltava W. Benjamim.

Resumindo:

“Cada macaco no seu galho seja com que roupa for”.                                                         

                                                           (Zédú Neves  – 06/09/2012 – 02h:35m)

3 Comentários

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3 Respostas para “A moda na história do corpo… Corpo, gêneros e afins… Cada macaco no seu galho.

  1. Gostei muito do seu texto. E como dizia Paulo Freire, as pessoas estão num permanente movimento de busca, que ele chama de “vocação do ser mais”. O grande problema é a desumanização, que procura afastar essa possibilidade e se dá de diversas formas, dentre elas através do preconceito, da injustiça e da corrupção. A sociedade precisa “mudar de roupa”. Não existe nenhum spray milagroso capaz de esconder nossas imperfeições morais.
    Adriana Torquato Resende

  2. Gostei do seu texto Zédu. Acredito que essa deveria ser alvo de muitas reflexões e discussões, principalmente com os jovens que hoje encontramos na sociedade.
    Adriana Neves

  3. Pois é, este é um texto em que vc ainda está no paradigma binário do sexo. Acho que sua visão de mundo mudou um pouco, não?

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